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O VELHO RELÓGIO

Quando vovó morreu, mamãe vendeu o carrilhão da sala de jantar. Segundo ela, a lembrança seria menos dolorosa se não mais ouvisse o som da música marcando as horas. Fiquei triste porque, menino ainda, gostava daquele relógio solene.

Rodamos toda manhã até que uma loja velha, onde se lia ‘Compram-se antiguidades’ chamou-nos a atenção. Entramos e na penumbra que nos acolheu, onde outros objetos se amontoavam, um homem muito magro, rosto agudo, examinou o carrilhão. Ofereceu um bom preço e minha mãe aceitou.

No dia seguinte, ao passar pela loja, notei que estava fechada. Tentei espiar pelos vidros sujos da porta principal, mas não vi nada.

Anos depois, mamãe morreu. Como ela, pensei em me desfazer de alguns objetos que me traziam uma saudade especial. Sem perceber, voltei a passar em frente à velha loja e, com espanto, notei que estava novamente aberta. Entrei, timidamente, e o mesmo homem me recebeu. Não mudara nada, apesar dos anos. Lembrou-se de mim e mostrou, ao fundo, o carrilhão de vovó. Perguntou em que poderia ser útil. Agradeci e sai, rápido.

Não vendi nada que foi de mamãe. E nunca mais passei pela loja que, certamente, deve estar aberta, esperando minha volta.


alexandre gazineo
Enviado por alexandre gazineo em 23/01/2008
Alterado em 08/06/2012


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