Quando acendo um cigarro
E deixo a música fluir suave
Do milímetro invisível que habita
O espaço entre o disco e a agulha
Vejo-me logo cercado
Pela imensa multidão urbana
Que me sufoca e gargalha aos meus ouvidos.
(eu, que só queria um pouco de música...).
Voltando ao cigarro
Ao halo de luz que acende este instante
Distante
Porque há dias nada escrevo
Decidi apagá-lo
Um poema já basta em noite tão monótona.
Porém, quando decido falar de mim
Como agora faço, acredite
O que queria era mesmo falar de você
De suas ideias, suas pequenas manias
Sua árvore genealógica.
Mas sei que não posso, e você entende
Não tenho seu telefone
Desconheço seu endereço
Mas aceite minha incondicional preocupação
Meu rosto tenso, minha silhueta século 20.
É o que posso fazer
Enquanto a orquestra conspira no vinil
Para que este não seja outro poema egoísta
Umbilical, circular
Sinfonia de um só maestro.
(se eu soubesse que tons te excitam...)
Há muito guardo esta proposta
Escrever e pedir desculpas àqueles
Que não compartilham esse abandono
Mãos emperradas, cansadas
Olhos avermelhados, uma linha, depois outra
Enquanto o mundo dobra a esquina
À direita...