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2 – Western – Hollywood e a Longa Cavalgada (1900-1960).


O primeiro western foi rodado em 1903, dirigido por Edwin S. Porter e estrelado por Gilbert M. Anderson, também conhecido como ‘Broncho Billy’e chamava-se The Great Train Robbery. Anderson é considerado o pai dos filmes de western e recebeu um Oscar Honorário em 1958 pelos relevantes serviços prestados ao cinema. Atuou em 357 filmes entre 1903 e 1919 e a sua última aparição nas telas, em uma ponta, foi em 1965 no filme The Bounty Killer, de Spencer Gordon Bennett.

A época do cinema mudo viu surgir um grande número de atores de faroeste que se tornaram ídolos populares em todo o mundo, inclusive no Brasil. Thomas Hezikiah Mix (Tom Mix) foi o rei do western ao longo de toda a década de vinte, disputando a preferência do público com Charles Frederick Gebhart (Buck Jones) e William S. Hart.

Tom Mix nasceu em 06 de janeiro de 1880 em Mix Run, no Estado da Pensylvannia e morreu em um acidente de carro, em pleno deserto do Arizona, em 12 de outubro de 1940. Rodou o seu primeiro filme, Ranch Life in the Great Southwest em 1910. Além de atuar, Tom Mix também escrevia roteiros e dirigia e é apontado como o primeiro ator de faroeste a dar especial destaque ao cavalo nos filmes. Para tanto, sempre aparecia com o seu cavalo, Tony, presença constante em suas aventuras.

 
De 1910 a 1935, quando se afastou do cinema, Tom Mix atuou em 287 filmes. A característica mais relevante de Tom Mix é que o seu estilo de interpretação adotava, de certo modo, um ar cômico, fazendo de seus filmes faroestes menos violentos. A sua carreira se encerrou porque, ao lado de muitos outros grandes nomes do cinema mudo, não conseguiu sobreviver ao cinema falado. Por esta razão, eram conhecidas sua má vontade e antipatia com John Wayne. Quando indagado sobre o jovem ator por um repórter em uma entrevista em um programa de rádio, Mix respondeu que não via nele qualquer talento.

Buck Jones é considerado o maior nome do western-B. Nasceu em 04 de dezembro de 1889, em Vincennes, Indiana, e morreu em um incêndio em uma boate chamada Cocunut Grove, em Boston, no dia 30 de novembro de 1942. Seu primeiro filme foi The Two Doyles (1919) e a sua carreira se estendeu, com sucesso, até 1942, quando fez seu último filme, Dawn on the Great Divide. Buck Jones tinha um estilo mais sóbrio, o que combinava com o seu tipo físico, forte e atlético. Ao contrário de Tom Mix, com quem disputava popularidade durante a década de vinte, sobreviveu ao advento do cinema falado e fez 74 filmes neste novo ciclo, o primeiro deles The Lone Ranger (1930), dirigido por Louis King.

 
William S. Hart nasceu em 06 de dezembro de 1864 em Newburgh, no Estado de New York e morreu em 23 de junho de 1946. Ao contrário de Tom Mix e de Buck Jones, Hart tinha formação de ator e era egresso do teatro, onde atuou, em papéis de vilão, em espetáculos como The Virginian e The Squaw Man. Sua estréia no cinema não se deu em um faroeste, mas sim na primeira versão de Ben-Hur, de 1907, onde viveu o centurião romano Messala. Só retornou ao cinema sete anos depois, em The Bad Buck of Santa Ynez, o seu primeiro faroeste. Hart dirigiu 53 dos 75 filmes em que atuou. Tinha um estilo de interpretação sombrio e carrancudo, e, na opinião do crítico Leonard Maltin, Hart foi o autor dos primeiros clássicos do faroeste, Hell’s Hinges de 1916 e The Toll Gate de 1920. Como Tom Mix, Hart não seguiu carreira no cinema falado, sendo o seu último filme Tumbleweeds de 1925.
 
O primeiro faroeste sonoro foi In Old Arizona, de 1928, dirigido por Irving Cummings e Raoul Walsh, e estrelado por Warner Baxter, que interpreta neste filme o celebre personagem Cisco The Kid. O filme foi indicado para 04 Oscars nas categorias de Melhor Ator, Melhor Cinematografia, Melhor Diretor e Melhor Roteiro. Warner Baxter levou o Oscar de melhor ator, sendo certo que este foi o primeiro grande prêmio ganho por um faroeste na história, embora Baxter não fosse um ator típico do gênero, tendo atuado em produções diversas, como O Grande Gatsby ( The Great Gatsby) (1926) e 42nd Street (1933).
 
A partir da década de trinta, o faroeste passa por um processo de aprofundamento temático e começam a ser produzidos filmes que se distanciam, consideravelmente, dos exemplares do ciclo do cinema mudo. Uma nova geração de diretores e atores imprime ao faroeste uma conotação mais séria, com narrativas mais elaboradas e a fixação de estilos de direção que iram permear todo o gênero durante as décadas seguintes.

Já em 1931, surge Cimarron, de Wesley Ruggles, baseado na novela de Edna Ferber. O filme foi indicado para 7 Oscars, tendo sido premiado nas categorias de Melhor Direção de Arte (Max Rée), Melhor Filme e Melhor Roteiro Adaptado (Howard Estabrook). Em 1935 Edward Dmytryk faz sua estréia na direção, em um faroeste, sob o título The Hawk. Os anos trinta é a década que vê explodir a carreira de um dos atores mais marcantes do gênero, John Wayne , que já em 1930 surge no clássico The Big Trail, de Raoul Walsh e segue durante os anos seguintes fazendo diversos outros faroestes, sob a direção de Robert N. Bradbury (The Lucky Texan e de The Man From Utah, de 1934), Arthur Lubin (California Straight Ahead!, de 1937), George Sherman (Pals on the Saddle, de 1938).

 

Em 1939 Wayne interpreta Ringo Kid, no clássico No Tempo das Diligências ( Stagecoach) de John Ford, filme que marcou época na história não só do faroeste, mas de todo o cinema. Para o crítico George Chabot, o filme Stagecoach deu o tom para todos os filmes de faroeste produzidos no século XX. Chabot destaca que o filme é uma peça moralista e cada personagem um arquétipo, mas tão bem estabelecidos que é impossível vê-los como meros clichês. Ainda segundo Chabot, a excelência da direção de Ford é tanta que Orson Welles teria assistido ao filme cerca de quarenta vezes, antes de começar a rodar Citizen Kane, de 1941.

Para o crítico Leonard Maltin, o filme Stagecoach é:

'Um dos grandes filmes americanos, um marco em termos de maturidade no gênero do western, com um bem equilibrado estudo dos personagens e perfeitas cenas de ação (a exemplo do longo ataque dos índios, onde se apresenta o famoso trabalho de dublês de Yakima Cannutt). O filme também lançou ao estrelato John Wayne'.

Mas a década de trinta, por outro lado, não abandonou os faroestes mais ingênuos, centrados na figura de atores que encarnavam os próprios heróis queridos pelo público.

Nesta linha, surge Roy Rogers, que foi chamado de ‘O Rei dos Cowboys’ tendo estrelado cerca de noventa faroestes, tais como Under Western Star (1938) de Joseph Kane e Jeepers Creepers (1939) de Frank McDonald. Também Gene Autry, ator, cantor e compositor, que recebeu o título de ‘O Cowboy Favorito da América’. Mais cantor do que propriamente ator, Autry iniciou a carreira em 1934 com In Old Santa Fé, justamente em um pequeno papel de cantor, filme que era estrelado por outro cowboy emblemático, Ken Maynard. Autry trabalhou até 1953, quando rodou o seu último faroeste, Last of the Pony Riders.

A década de quarenta é a década em que a deflagração da Segunda Guerra Mundial vai influenciar sobremaneira a produção de cinema nos Estados Unidos. A necessidade de destacar as virtudes do american way of life , da democracia, dos Estados Unidos como país da liberdade e da justiça, em contraposição ao espectro totalitário do nazismo, coloca, em boa medida, a indústria do cinema sob as necessidades e imperativos da ação política da época.

Nesta década, por força da chamada política de boa vizinhança com os países aliados, o cinema americano volta os olhos para a América Latina, e em uma ação de cooptação cultural, atrai para a poderosa indústria do cinema estadunidense artistas originários de países desta região, até então absolutamente marginalizada, a exemplo de Carmem Miranda, que em 1941 faz o seu primeiro filme nos EUA, That Night in Rio.

 
Para o western, a década de quarenta foi proveitosa, já que então alguns dos clássicos do gênero foram produzidos. É bem verdade que cineastas do porte de John Ford e outros estavam envolvidos em fazer filmes de propaganda antinazista; apenas como exemplo, Ford em 1942 dirigiu um documentário chamado Battle of Midway , sobre a famosa batalha no Pacífico Sul, tendo como narradores atores do porte de Henry Fonda.
 
Mas esta forte presença do espectro da Guerra Mundial e a cooptação pelo governo Roosevelt do cinema e de seus diretores como instrumentos de propaganda americana, não impediu que a favor do faroeste surgissem filmes como A marca do Zorro ( The Mark of Zorro) (1940), de Rouben Mamoulian, com Tyrone Power em uma de suas mais populares aparições, Virginia City (1940) de Michael Curtiz, Texas (1941) de George Marshall e Bufallo Bill (1944) de William Welmann.

Findo o período da guerra – que se estendeu de 1939 a 1945 – o faroeste ganha novo fôlego e inicia a sua fase áurea, que vai se estender até meados da década de sessenta.

Entre 1945 e 1950, o cinema americano produziu 691 filmes de faroeste, e em apenas cinco anos trouxe à tela vários clássicos, como Duelo ao Sol (Duel in the Sun) (1946), de King Vidor, Fort Apache (1948) de John Ford, que rendeu a Ford o prêmio de melhor diretor no Festival Internacional de Locarno, na Itália, Rio Vermelho (Red River) (1948) de
Howard Hawks, indicado ao Oscar de Melhor Edição e Melhor Roteiro em 1949, e Rio Grande (1950) de John Ford. Aqui vale sublinhar a atuação de John Wayne, que dentre os filmes destacados, apenas não atuou em Duelo ao Sol, que foi estrelado por Gregory Peck, Joseph Cotten e Jennifer Jones, em desempenho que lhe valeu a indicação ao Oscar de Melhor Atriz em 1947.
Os anos cinqüenta marcam o aprofundamento da Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética e o combate ideológico entre o Mundo Livre, representado pela economia capitalista americana e a Cortina de Ferro, expressão cunhada por Winston Churchill abrangendo a União Soviética e os países da Europa Oriental postos sob sua influência direta, tais como a Hungria e a Polônia.

Entre 1950 e 1956 o cenário político americano ferve sobre uma cruzada anticomunista que foi capitaneada pelo senador republicano Joseph McCarthy, que ocupou o Senado como representante do Estado do Wisconsin de 1947 a 1957.

Durante os seus dez anos de mandato, McCarthy e sua equipe se tornaram célebres pelas investigações agressivas e até paranóicas contra o próprio governo federal dos Estados Unidos e pela campanha difamadora promovida contra todos aqueles que eram suspeitos de simpatizar com o comunismo. Deste modo, um grande número de pessoas das mais variadas atividades foi posta sob investigação, acusados, inclusive, de espionagem contra os interesses do país a soldo da URSS.

 
Dentre os investigados se encontravam autoridades do próprio governo, profissionais de imprensa e muitos atores e diretores de cinema, dentre os quais vale destacar Humphrey Bogart, Laureen Bacall, Kirk Douglas, Orson Welles, Charles Chaplin, Gregory Peck, Burt Lancaster, John Houston, Edward Dmytryk, Dalton Trumbo, dentre outros. Lamentavelmente, outros expoentes do cinema americano atuaram como colaboradores do comitê McCarthy, apresentando delações contra seus próprios colegas, a exemplo de Ronald Reagan, Gary Cooper e Robert Taylor.
 
O efeito do macartismo em diversas carreiras foi simplesmente devastador. Embora nomes consagrados como Burt Lancaster e Gregory Peck não sofressem descontinuidade em suas carreiras (Lancaster foi indicado ao Oscar de Melhor Ator em 1954 por A Um Passo da Eternidade (From Here to Eternity) de Fred Zinemann e Peck filmou dois dos grandes sucessos de sua longa carreira, As Neves do Kilimanjaro (The Snows of Kilimanjaro) (1952) de Henry King e A Princesa e o Plebeu (Roman Holliday) (1953) de William Wyler, que deu a Audrey Hepburn o Oscar de Melhor Atriz em 1954) outros atores, diretores e roteiristas não tiveram a mesma sorte.

Um dos maiores exemplos foi o roteirista Dalton Trumbo que a partir de 1951 passa a escrever roteiros sem que o seu nome seja veiculado nos créditos, situação que perdurou até o final da década de cinqüenta. Neste período, Trumbo, que escreveu o roteiro de A Princesa e o Plebeu (Roman Holiday) e que recebeu o Oscar de Melhor Roteiro por esse trabalho, ao lado de Ian McLellan Hunter, escreveu o roteiro de dois faroestes, o primeiro The Deerslayer (1957) de Kurt Neumann e Cowboy (1958) de Delmer Daves, dois diretores muito ativos na produção de faroestes durante os anos cinqüenta.

 

Outra vítima foi Orson Welles, que se encontrava no auge da carreira quando se abateu sobre ele a perseguição macartista. Welles atravessara a década anterior dirigindo clássicos como Cidadão Kane (Citizen Kane) (1941), A Dama de Shangai (The Lady From Shangai) (1947) e Macbeth (1948). A década de cinqüenta para este gênio do cinema foi o que se poderia chamar de ‘década perdida’, já que somente em 1958 ele retorna às telas com o marcante A Marca da Maldade ( Touch of Evil) (1958).

Porém, essa época dramática na história dos Estados Unidos, cedeu espaço a novos tempos, coincidentemente com a queda de popularidade do seu maior mentor, o senador MacCarthy. Sua ascensão no quadro político, que durou cerca de dois anos, não o impediu de ter uma queda fulminante.

Inflamado porta-voz da perseguição política interna, o senador republicano passou a extrapolar e atingir pessoas de destaque, inclusive, membros do próprio partido republicano. O fator fundamental de sua queda foi a tentativa por ele empreendida de disputar o poder máximo dentro da estrutura do partido republicano com o então presidente dos Estados Unidos, Eisenhower, aliada à sua desastrada insistência em obter acesso aos arquivos confidenciais das forças militares.

O fim da era macartista vai marcar um decréscimo considerável na produção de faroestes nos Estados Unidos. Se em apenas cinco anos, entre 1945 e 1950, o cinema americano produziu 691 faroestes, na década que sucedeu o período aqui analisado (1956/1966) este número caiu para 412 títulos.

Este desprestígio do gênero, evidenciado pela expressiva diminuição na produção, pode ser justificado por diversos aspectos.

O primeiro deles são as novas demandas sociais e políticas trazidas pelo desenvolvimento da ciência e da tecnologia como decorrência dos grandes investimentos e das grandes transformações neste cenário, trazidos pela Guerra Mundial. O mundo se modernizava e as histórias de velhos pistoleiros montados em cavalo, as ameaças de comanches e apaches enfurecidos, pareciam, ao espectador da época, como estórias grotescas e antiquadas, sem qualquer padrão de reconhecimento e empatia com o momento que se vivia.

 
Exemplo desta tendência pode ser apontado se comparados os índices de produção de outros gêneros de filmes. Afinado com o novo panorama tecnológico e científico, com o início do revolucionário Projeto Espacial, que introduz o homem no desafio supremo do espaço sideral, cabe observar que os filmes de ficção científica, que no período compreendido entre 1946-1956 tinham atingido 120 títulos, na década correspondente a 1956-1966 saltam para 201 títulos, em um crescimento de quase setenta por cento.

Somado a este aspecto, o final dos anos cinqüenta e o início dos anos sessenta vai ver surgir o movimento social e político conhecido como Contracultura.

Este movimento vai contestar o mito da sociedade norte-americana como guardiã da democracia mundial e detentora da receita de felicidade da comunidade internacional. Intensifica-se com a indesejada participação dos EUA na Guerra do Vietnã e hostiliza, decididamente, a chamada Doutrina Truman, um dos primados da política externa norte americana, que era a adoção de operações militares para a salvação de ‘governos amigos’, como ocorreu na Guerra da Coréia. Esta doutrina conclamava os esforços nacionais no sentido de valorizar os ideais do ‘mundo livre’ e, conseqüentemente, apoiar incondicionalmente as atividades militares das forças norte americanas no exterior.

 
Esta doutrina não convenceu a então juventude universitária e nem muito menos aos escritores e intelectuais. Para esta importante fatia da opinião pública, a Doutrina Truman não passava de um pretexto para a afirmação de uma política imperialista. E neste cenário a Guerra do Vietnã oferecia a munição que os críticos precisavam. Uma guerra sem razões estratégicas razoáveis, empreendida contra um pequeno e distante país da Ásia, e que serviu, sob o manto de uma ilusória ajuda humanitária, em um campo de experimentação para armas sofisticadas, massacres e outras atrocidades.

A Contracultura estava diretamente associada a uma postura pacifista e de negação dos valores tradicionais da sociedade americana. O seu núcleo mais visível deu-se com a eclosão do chamado movimento ‘hippie’, em meados dos anos sessenta, movimento que espraiou sua influência para a literatura, a música e o cinema, conformando, em boa medida, a produção artística da época, a uma submissão aos novos cânones do movimento.
 
O movimento ‘hippie’ rejeitava com veemência os valores do americano médio. Seus paradigmas de influência eram, na literatura, o escritor alemão Herman Hesse, cuja obra centrava-se, em boa parte, em histórias focadas na civilização oriental e em suas técnicas de meditação e introspecção filosófica. Também Wilhem Reich, que em suas obras sustentava que a agressividade social estaria ligada à repressão sexual contra os jovens e adolescentes pelos adultos (ou seja, pela geração que detinha o poder). Na música, o rock de contestação – que vai provocar o isolamento dos ídolos iniciais desse gênero, a exemplo de Elvis Presley, Bill Haley e outros, considerados, então, ‘alienados’ – é a música por excelência dos novos tempos, nas vozes e nas guitarras de Janis Joplin, Jimmy Hendrix, Bob Dylan e Jim Morrison.
 
Neste cenário, que vai perdurar durante toda a década de sessenta, filmes de faroeste, sem dúvida, surgiriam como um elemento absolutamente indesejado, a rigor, anacrônicos. Trata-se também aqui de apontar que o desenvolvimento da Contracultura gerou, para a produção de filmes de faroeste, não apenas um desconforto social, político ou mesmo filosófico. A nova postura das classes jovens – que são consumidores por excelência, notadamente em uma sociedade que já era a primeira economia mundial – trouxe um obstáculo de cunho econômico a este gênero de produção cinematográfica, uma vez que o mercado tornou-se extremamente refratário. A indústria do cinema, portanto, sempre afinada com as tendências do público que a financia, não hesitou em acatar este processo inevitável de superação estilística.
 
Como decorrência deste complexo de tendências e de novas realidades artísticas e culturais, o faroeste, tão louvado em épocas anteriores, começa a sofrer o esvaziamento progressivo dos seus grandes realizadores, que já não mais encontram estímulo e apoio para continuar a produção de faroestes. Este aspecto não apenas diz respeito à redução considerável da produção de faroestes nos EUA na década de sessenta, mas, também, relaciona-se com a sua progressiva perda de qualidade.

Neste sentido, vale apontar alguns dados que evidenciam o desestímulo – quando não o efetivo abandono – do gênero, no período em foco, pelos seus mais destacados artistas.


John Ford considerado por muitos como o maior diretor do gênero, filma o clássico O Homem que Matou o Facínora (The Man Who Shot Liberty Valance) com o conservador John Wayne em um de seus melhores momentos, em 1962. Retorna ao faroeste no ano seguinte com A Conquista do Oeste (How the West Was Won), no qual alterna a direção com outro veterano, Henry Hathaway, conduzindo um elenco estelar onde se destacam Gregory Peck, Henry Fonda, James Stewart, John Wayne e Richard Widmark. Este filme marca quase a sua despedida efetiva do cinema, já que seus outros filmes – o último um documentário de 1976 sobre a vida do General Lewis Puller – não tiveram mais qualquer repercussão.

Anthony Mann, importante diretor do gênero nos anos cinqüenta, autor de clássicos como Winchester 73, de 1950 e o O Homem do Oeste (Man of the West) de 1958, despede-se do gênero, segundo alguns críticos, de forma melancólica, na refilmagem de Cimarron, em 1960.

Howard Hawks, entre 1960 e 1970, dirige apenas dois faroestes. O primeiro deles somente em 1966, El Dorado e o outro, em 1970 – seu último filme – Rio Lobo, ambos estrelados por John Wayne.


Necessário abrir espaço especial para um nome muitas vezes aqui repetido. John Wayne representou muito mais do que um ator emblemático do gênero faroeste. Não é exagero afirmar que o seu talento, a sua firme convicção pessoal – muitas vezes externando opiniões e posições políticas criticáveis – foi um fator determinante, quase isolado, para que não se concretizasse a absoluta derrocada do faroeste no cinema americano.

Em plenos anos sessenta, no ferver da Contracultura, do movimento ‘hippie’, da idealização entre a juventude e grande parte da intelectualidade de figuras que encarnavam a resistência heróica contra o cruel imperialismo norte americano, como Guevara e Castro, John Wayne manteve-se imperturbável. Não abandonou as grandes pradarias, os tiroteios, não desmontou de seu cavalo. A sua persistência – talvez até mais pessoal do que resultado de uma consciência artística – permitiu que alguns clássicos do gênero fossem produzidos, não obstante o ambiente pouco favorável.

Durante os anos sessenta, Wayne protagonizou clássicos como O Homem que Matou o Facínora (The Man Who Shot Liberty Valance), de 1962, sob a batuta do amigo e velho companheiro John Ford. Filme capital no gênero, e em toda a história do cinema, tem uma das frases mais expressivas já ditas em um dialogo: quando a lenda se tornar fato, imprima a lenda.


Segundo o crítico James Berardinelli, que, em seu comentário, sublinha não ser um fã do gênero, atribuindo tal fato à apatia da sua própria geração, que fez o faroeste desaparecer dos cinemas, registra que No tempo das Diligências é mais que um faroeste, situando-se como obra profundamente reflexiva, com uma história envolvente e intensa, a serviço de um tema profundo. Berardinelli, inclusive, coloca o filme entre os cem melhores de todos os tempos.

Mas a atuação de Wayne não se limitou, no período, apenas ao trabalho de ator. Em 1960 ele se postou atrás das câmeras e dirigiu O Álamo, uma versão da conquista pelos americanos do Estado do Texas diante dos mexicanos liderados pelo General Sant’anna.

Mais politicamente incorreto impossível.


Ainda em 1960, atuou ao lado de Stewart Granger e do ídolo das adolescentes, o cantor de pop-rock Fabian (cujo nome verdadeiro era Fabiano Anthony Forte), sob a direção de Henry Hathaway, em Fúria no Alasca (North to Alasca), filme que foi bem acolhido pelo público, mas desprezado pelos críticos .

O interessante neste filme é que ele mistura elementos de comicidade quase pastelão em um gênero que se caracterizava pela sobriedade e intensidade de temas, sendo, neste particular, um predecessor para uma abordagem que será decisivamente enriquecida pelo western spaghetti em alguns dos filmes produzidos neste ciclo.

Em 1961, atua em Os Comancheros (The Comancheros), dirigido por Michael Curtiz - diretor de Casablanca - em seu último trabalho (Curtiz morreria no ano seguinte, de câncer). Pela sua atuação neste filme, Wayne recebeu o prêmio Laurel, de melhor ator em filme de ação.


A década de sessenta continuou produtiva para John Wayne, que em 1962 atua em O Homem que matou o Facínora (The man who Shot Liberty Valance), um dos filmes mais marcantes de toda sua carreira. Em 1962 vive o General Sherman, personagem histórico, comandante das tropas do Exército da União durante a Guerra de Secessão (1961-1965) no filme A Conquista do Oeste (How the West was Won), dirigido a quatro mãos pelos veteranos John Ford e Henry Hathaway.

Este filme, de certo modo, atesta as dificuldades vividas pelo gênero do faroeste, à época. A Conquista do Oeste buscou se apoiar em dois pontos de atração para o público; o primeiro, a reunião de um elenco estelar, com atores representativos do gênero, a começar pelo próprio John Wayne, ao lado de Gregory Peck, Richard Widmark, Henry Fonda e James Stewart; o outro aspecto, de natureza técnica, foi o uso do Cinerama, recurso que permitia a filmagem em uma bitola de 70 mm (setenta milímetros), quando o usual era a bitola de 36mm (trinta e seis milímetros), tendo sido o primeiro filme de ficção a usar esta técnica.

Mesmo assim o filme não foi propriamente um êxito de bilheteria. Tendo tido um gasto estimado de quinze milhões de dólares, atingiu a bilheteria de cinqüenta milhões de dólares em todo o mundo. Só para estabelecer uma comparação, o filme 007 Contra o Satânico Dr. No (Dr. No), que abriu a longeva e ainda viva série do super-agente britânico James Bond, feito no mesmo ano, teve um custo estimado de um milhão e cem mil dólares e alcançou a cifra de cinqüenta e nove milhões e seiscentos mil dólares nas bilheterias de todo mundo.


Em 1963 Wayne estrela o faroeste comédia O Barão do Oeste (McLintock!), ao lado de Maureen O’Hara, dirigido por Andrew V. McLagen. McLagen, filho do ator Victor McLagen, apesar de não ter alcançado um nível de excelência como diretor, foi responsável pela ‘resistência’ nos anos sessenta a favor do faroeste, sendo um dos mais ativos realizadores do gênero na década; dirigiu bons trabalhos, o melhor deles, Shenandoah, de 1965, com James Stewart, um drama bem construído sobre a estória de uma família de fazendeiros envolvida em um conflito na Guerra Civil Americana.

Ainda durante os anos sessenta Wayne montaria em seu cavalo para estrelar em 1965 Os Filhos de Katie Elder (Sons of Katie Elder, The), dirigido por Henry Hathaway, ao lado de Dean Martin. Em 1966 Howard Hawks dirige El Dorado, quase uma refilmagem do fenomenal Onde Começa o Inferno (Rio Bravo) onde Wayne contracena com outro ator marcante de Hollywood, Robert Mitchum. No ano seguinte, sob a batuta de Burt Kennedy – diretor de alguns faroestes interessantes, como A Espinha do Diabo (Deserter, The) de 1971– Wayne junta força com Kirk Douglas em O Barão do Gado (War Wagon).


Os anos sessenta terminam para Wayne em consagração. Com Bravura Indômita (True Grit), de 1969, dirigido por Henry Hathaway, Wayne, vivendo o bêbado e irreverente xerife Rooster Cogburn – personagem que voltaria a encarnar em 1975 no filme Rooster Cogburn – ganhou o Oscar de Melhor Ator em 1970, suplantando atores como Dustin Hoffman e Jon Voight (indicados por Perdidos na Noite (Midnight Cowboy), Richard Burton (indicado por Ana dos Mil Dias (Anne of Thousand Days) e Peter O’Toole (indicado por Adeus, Mr. Chips (Goodbye, Mr. Chips).

Este parêntese mais ou menos extenso não podia deixar de ser apresentado, sob pena de não se abordar um das figuras mais marcantes na construção do gênero faroeste. Também é curioso observar que, mesmo após o advento do ciclo do faroeste italiano, Wayne continuava em sua rota pelo velho Oeste. Um tanto solitário, talvez. Mas com a coragem de sempre.


 
alexandre gazineo
Enviado por alexandre gazineo em 10/05/2007
Alterado em 20/05/2013


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